Além-mar

Rachel Verano rodou o mundo, mas foi por Portugal que essa mineira caiu de amores e lá se vão, entre idas e vindas, quase dez anos. Do Algarve a Trás-os-Montes, aqui ela esquadrinha as descobertas pelo país que escolheu para chamar de seu
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Cervejaria Trindade: o clássico de 1836 está de volta ao Chiado, em Lisboa

Fomos conhecer a nova casa, um antigo convento, que ganhou um belo banho de tinta e assinatura de chef estrelado

Por Rachel Verano
Atualizado em 9 jan 2023, 11h39 - Publicado em 8 jan 2023, 12h05
Salão do restaurante com pisco quadriculado em preto e branco sob teto abobadado, onde se vê uma oliveira ao centro
O salão principal do restaurante: séculos de história e um belo banho de tinta. (Bruno Barata/Reprodução)

Desde que Lisboa começou a ficar cheia demais e que as reservas para jantar fora se tornaram imprescindíveis, coisa de cinco ou seis anos atrás, sempre tive na Cervejaria Trindade um pouso seguro para noites decididas na última hora. Independentemente da hora ou do número de pessoas, sempre era possível conseguir uma mesa num cantinho ou outro (mais mérito das proporções gigantescas do que qualquer outra coisa). A experiência nunca era fantástica – a casa já dava os sinais do tempo, mas a comida seguia mais ou menos gostosa e, o serviço, atencioso como de costume em casas da velha guarda.

Uma funcionária tira uma cerveja de pressão no bar da cervejaria, com painéis de azulejo como pano de fundo
A cervejaria mostrando suas raízes. (Bruno Barata/Reprodução)

Então em 2021 a Trindade fechou.

Balcão da cervejaria recheado de mariscos
O balcão de delícias da casa. (Bruno Barata/Reprodução)

Foi com grande curiosidade que acompanhei os rumores da sua reabertura no último mês de setembro, depois de longos meses de uma intensa reforma – mas só agora tive a oportunidade de ir ver de perto, e logo numa mesa com mais 12 pessoas (perfeita para provar muitas coisas).

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Um dos ambientes da cervejaria dedicado aos petiscos, com mesas mais informais e painéis de azulejo coloridos nas paredes
O ambiente da Petiscaria, na entrada do restaurante: ideal para provar clássicos e tomar uns copos. (Bruno Barata/Reprodução)

Primeiro impacto: a reforma foi brilhante. A reabertura da nova Cervejaria Trindade não trouxe de volta apenas a cervejaria mais antiga de Lisboa, mas também um patrimônio com mais de oito séculos de história. Inaugurado como Convento da Santíssima Trindade dos Frades Trinos da Rendenção dos Castiços no século 13, o lugar abriu como cervejaria em 1836 e as mesas e balcões se espalham por antigos átrios, salões e refeitórios sob tetos abobadados lindíssimos. Nas paredes, seguem os bonitos painéis de azulejos do século 19 e, onde hoje fica o salão principal do restaurante, as obras da artista Maria Keil do Amaral feitas em pedras portuguesas nos anos 1940 – agora, embelezadas por uma linda oliveira no centro.

Cerveja da casa sendo servida num copo
Cerveja da casa: como o próprio nome indica, a bebida segue fabricada pela casa. (Bruno Barata/Reprodução)

A atual Trindade se divide em petiscaria, nas salas de entrada, e restaurante, na sala ao fundo – ou seja, é possível ir só beber uns copos e provar os deliciosos croquetes (servidos quentinhos, com recheio macio e casquinha crocante) e pastéis de bacalhau (o que conhecemos como bolinhos, mais rústicos e sempre sequinhos). A cerveja da casa pode ser Vienna Lager, Indian Pale Ale ou American Wheat (mas tem também Sagres, Bohemia, Heineken e Guinness para quem preferir).

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Pequena travessa de cobre com um bolinho de bacalhau, uma das especialidades do restaurante
Bolinho de bacalhau, para começar: crocante e quentinho. (Bruno Barata/Reprodução)

De maneira geral, a cozinha deu um belo salto – algo que era esperado com a entrada em cena do chef Alexandre Silva, dono de uma estrela Michelin no Loco. Os preços, idem. Se antes jantava-se despreocupadamente, agora é preciso estar atento e forte – há extravagâncias no menu como um único camarão tigre grelhado no carvão salpicado por um molho de ervas a custar exatos € 32,80. Ou uma mariscada por € 163.

Mesa posta com um prato de bofe e ovo frito, batatas fritas, legumes e um copo de cerveja
Bife da vazia com baratas fritas e ovo “estrelado”: um clássico. (Bruno Barata/Reprodução)

A nossa mesa pediu vários croquetes e bolinhos de bacalhau (€ 2,20 cada unidade), algumas ostras (€ 3 a unidade) e as crianças piraram mesmo foi com as batatas fritas sequinhas e gostosas (€ 3,20 a porção).

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Prato de polvo assado com batatas
Polvo no carvão com batatas a murro. (Bruno Barata/Reprodução)

Entre os pratos principais, metade da mesa apostou num dos clássicos portugueses de cervejaria: o bife da vazia (€ 17,90), acompanhado por um molho especial da casa, mais batata frita e um ovo para coroar. A outra metade foi de polvo assado no carvão servido sobre batatinhas ao murro (desde o documentário Professor Polvo, da Netflix, não consigo conceber comer polvo, mas quem provou amou). Importante: o prato, que a ementa diz ser para duas pessoas, serve quatro com fartura (€ 64). Minha aposta foi um tanto peculiar para o tipo de restaurante: um tagine de lentilhas com especiarias, que estava divino (€ 17,90).

O serviço foi caseiro e brilhante. Impossível não mencionar a delicadeza e amabilidade do Gabriel, nosso conterrâneo, que chegou a partir o bife no prato das crianças!

Uma das sobremesas do restaurante: uma fatia de pudim feito com cerveja, acompanhado de frutos cítricos
Pudim de cerveja para encerrar: delicioso. (Bruno Barata/Reprodução)
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O grand finale atendeu pelo nome de pudim de cerveja (€ 6,80). Um doce conventual denso e aveludado, de sabores intensos, guarnecido por frutos cítricos que dá água na boca só de lembrar. Pedimos também um arroz doce com casquinha queimada a maçarico e pequenas gotas de compota de limão (€ 5,90).

Espumantes, vinhos, águas, um drink sem álcool e até um Sumol de abacaxi depois, a conta saiu salgada mesmo para os padrões lisboetas atuais. Mas o jantar de despedida da família valeu como um programa turístico completo.

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