Em pleno aeroporto de Milão, a abóbora alugada por 20 euros ao dia foi convertida em uma carruagem Mercedes-Benz. Nossa Senhora do Upgrade operou o milagre na hora certa. Naquele dia com direito a dramas aeroportuários, a gata borralheira em questão se dirigia ao Lago de Como, playground da aristocracia no norte da Itália desde tempos imemoriais.
A cidade que dá nome ao lago, por exemplo, foi fundada pelo imperador Júlio César mais de 2 mil anos atrás. De Napoleão a JFK, de Madonna a Brad Pitt, incontáveis celebridades já recorreram ao lago para não verem ou serem vistas e em busca de inspiração.
Assim como o refúgio de George Clooney (a Villa Oleandra, do século 18, comprada por 10 milhões de dólares em 2002), muitos outros palacetes ilustram a linha do tempo local com fachadas renascentistas e neoclássicas.
Forjado pela ação glacial há milhares de anos, em forma de Y invertido, o terceiro maior lago da Itália se derrama aos pés dos Alpes. A despeito de todo glamour do lugar, a grande atração é o cenário em si – e isso, por sorte, é acessível a qualquer plebleu.
Minha alegria turbinada pelo motor alemão durou 40 minutos, tempo que se leva para ir do aeroporto de Malpensa até a cidade de Como por autopista. A partir daí, é preciso ter paciência nas estradinhas estreitas e congestionadas.
Depois do enésimo semáforo, você estará convencido de que as lanchinhas de madeira que singram as águas azulíssimas de Como não são apenas brinquedinhos de James Bond (várias cenas de Casino Royale foram rodadas ali, aliás). Navegar é a melhor forma de transporte do pedaço, inclusive para os mortais.
As principais cidadezinhas da região são conectadas por um sistema de ferrys e barcos (horários neste site), que cruzam o lago em ziguezague. Além de encurtar o caminho entre as margens, as travessias por água – e os passeios que qualquer hotel ou agência pode organizar – são ótimas para contemplar a grandeza da paisagem.
As curtas distâncias, no fim das contas, são uma ilusão. Por isso, melhor não cair na tentação de fazer um bate e volta a partir de Milão e ficar pelo menos uma ou duas noites. Há hotéis em conta e restaurantes bons e baratos infiltrados no planeta Como.
A linha de ferry une as cidadezinhas mais bonitas da região – Bellagio, Varenna e Menaggio. A primeira é a mais célebre, dominada pela Basílica de San Giacomo, em estilo romanesco e com acréscimos barrocos. Pontilhada de palacetes grandiosos como a Villa Serbelloni, que funciona como hotel desde o século 19, tem belíssimos jardins floridos, sorveterias e lojas incrementadas.
Já na pequenina Varenna, casinhas em tons de ocre e amarelo se debruçam sobre uma linda prainha de pedra. Coberta de trepadeiras floridas, uma bela passarela permite caminhar rente ao lago. Tomar sorvete em uma das escadinhas que levam à parte alta é um programa obrigatório – e o chocolate sem leite da La Passerella é um caso muito sério.
O trio de beldades se completa com Menaggio, que tem um portinho charmoso e um senhor passeio arborizado.
Entre Menaggio e Como, que também possui o seu charme, estão alguns dos hotéis míticos da região: o Villa d’Este, em Cernobbio, e o Grand Hotel, em Tremezzo. Ambos valem a visita, mesmo que para um cafezinho.
Hotel Il Sereno é a novidade estrelada da região
Com acesso por uma rua estreita no diminuto vilarejo de Torno, a 8 quilômetros de Como, o hotel Il Sereno é a novidade do pedaço – e aposta da família venezuelana Contreras, dona do hypado Le Sereno de St. Barths, no Caribe.
O novato destoa das grandes senhoras da hotelaria local. Em uma encosta, o discreto caixote de linhas finas se apoia sobre uma base de pedras, cercado de jardins verticais imbatíveis, obra do excêntrico botânico francês Patrick Blanc.
As lanchas que passam por ali reduzem a velocidade para os passageiros espiarem a apoteótica piscina de borda infinita.
Projetado pela arquiteta espanhola radicada em Milão Patricia Urquiola, o design de interiores é uma obra-prima, com móveis curvilíneos e cores da paisagem (verde, azul, cinza).
Uma escada cercada de vidro leva ao restaurante Berton Al Lago, no andar inferior. No cardápio, assinado por Andrea Berton (que pilota uma casa estrelada pelo Michelin com o seu nome, em Milão), predominam os peixes de água doce.
“Tenho certeza de que o George Clooney vai aparecer aqui. Não há outro restaurante no mesmo estilo nos arredores”, diz Samy M. Ghachem, diretor do Il Sereno.
Querendo mais privacidade, os hóspedes podem pagar 150 000 dólares por semana para ter à disposição o anexo Villa Pliniana, palazzo do século 16 com 19 suítes e salões forrados de obras de arte.
Foi o que fez Daniel Ek, fundador do Spotify, que se casou ali – tudo postado no Instagram do padrinho Mark Zuckerberg, mister Facebook.
Texto publicado na edição 255 da revista Viagem e Turismo (janeiro/2017)
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