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Nova Zelândia: uma viagem pela Ilha Norte de campervan

Um giro pelas paisagens deslumbrantes – ora geladas, ora fumegantes – da Ilha Norte da Nova Zelândia a bordo de um motorhome

Por Flávia Soares Julius
Atualizado em 20 ago 2019, 18h10 - Publicado em 21 Maio 2012, 13h08
Campervan com monte Ruapehu ao fundo  (Danita Delmond/David Wall/Diomedia/Reprodução)
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Fui eu que sugeri ao Andy, meu marido, que ficássemos em um hotel baratinho quando chegássemos a Auckland, a maior cidade da Nova Zelândia, localizada na Ilha Norte. A falta de conforto não seria uma questão naquela única noite que dormiríamos ali. Auckland, no nosso roteiro, era apenas um pernoite. No dia seguinte, embarcaríamos em uma campervan, uma versão menor do motorhome, para viver uma aventura estrada afora à la Pequena Miss Sunshine. No nosso caso, levaríamos a bordo duas misses, Stella e Sophia, nossas filhas de 4 anos e 1 ano respectivamente.

Na manhã seguinte, na recepção do hotel, lá estava John Managh, dono da Wilderness, a locadora de campervan, com as chaves de um Volkswagen Base Jumper 4. Foi amor à primeira vista. O veículo era grande, novo, tinha banheiro com chuveiro, louças tinindo, roupa de cama superdecente, DVD, TV de tela plana e um potente aquecimento a diesel, item de primeira necessidade para aquele invernal mês de agosto.

Auckland, Nova Zelândia
Marina de Auckland, a maior cidade da Nova Zelândia (Danita Delmond/David Wall/Diomedia/Reprodução)

Arrumamos as roupas nos armários, colocamos Stella e Sophia nas cadeirinhas de criança e partimos. O veículo, mesmo com 7 metros, era bastante estável. Nossa primeira parada foi em Thames, cidadezinha da Península Coromandel, 114 quilômetros a sudeste de Auckland. Ali, paramos em um supermercado da rede Pak’nSave e compramos provisões. Cozinharíamos, mas nada complicado: macarrão, ovos, verduras e sopas orgânicas da marca Naked, um hit na Nova Zelândia.

Campervan, Nova Zelândia
Sophia na porta da campervan (Flávia Soares Julius/Viagem e Turismo)

De Thames, pegamos uma estradinha sinuosa em direção ao vilarejo de Coromandel, 50 quilômetros adiante. De um lado da rodovia, o mar; do outro, colinas verdejantes. O percurso é pontuado por pontesinhas com apenas uma pista, então era preciso negociar a passagem com os demais veículos. O dia estava nublado, mas não chovia. Aliás, praticamente não choveu durante aqueles seis dias. Sorte nossa. Já a previsão de cair muita neve se confirmou, mas não sobre nossa cabeça. Ficamos sabendo depois que, na Ilha Sul, onde as temperaturas são geralmente mais baixas, a neve deixou muitas estradas intransitáveis.

Nação motorhome

Pouco depois da pequena Coromandel, decidimos passar a noite em um camping em fente a Shelly Beach (o nome atesta: a praia é lotada de conchas). Apenas uma outra campervan nos avizinhava. Naquela noite, jantamos macarrão, tomamos vinho e assistimos a um DVD. As pequenas achavam tudo o máximo, e era mesmo. Cheguei a pensar que poderia morar ali para sempre. Não é à toa que muitos kiwis, como são chamados os neozelandeses (kiwi, aliás, é o nome do pássaro símbolo do país, hoje ameaçado de extinção), possuem seu próprio motorhome.

Nova Zelândia
Placa anuncia a presença de kiwis (Westend61/Gaby Wojciech/Diomedia/Reprodução)

Férias, para boa parte deles, são sinônimo de acampar (há mais de 1 100 campings na Nova Zelândia). As dimensões do país são bastante propícias: apesar de dividido em duas ilhas, o território é compacto (juntas, elas não chegam ao tamanho do Rio Grande do Sul). Sem contar áreas pastáveis que formam imensos tapetes verdes, mais vulcões, altas montanhas, rios, florestas, cavernas e aproximadamente 15 mil quilômetros de costa.

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Naquela noite, em Shelly Beach, os bancos do fundão do veículo, que formavam uma salinha de estar, viraram uma espaçosa cama de casal. O assento atrás do motorista transformou-se em uma cama de solteiro e, acima dele, bastou puxar a tampa para surgir outra caminha. Mas a configuração que se mostrou mais gostosa, naquele dia e também nos outros, foi dormirmos os quatro aninhados no fundão.

A melhor hora era quando acordávamos. As meninas logo pulavam na cama, o Andy fazia café, e eu ficava olhando aquele mundo lindo ao redor do veículo, me sentindo dentro de um comercial de margarina. Naquela ma manhã, ignoramos o termômetro próximo do zero, calçamos nossos chinelos e fomos caminhar pela Hot Water Beach, a nossa próxima parada. Na maré baixa, as pessoas levam pás (ou alugam) e saem a fazer buracos na areia, o suficiente para brotar na superfície água termal que pode chegar a 60 graus. Enquanto alguns corajosos ficavam com o corpo todo imerso, preferimos fazer apenas um escalda-pés.

Dormimos a segunda noite em Whitianga, 32 quilômetros a sudeste de Coromandel. No dia seguinte, passamos pelas cidadezinhas de Ngatea, Te Aroha e Matamata. Esta última serviu de cenário para o filme O Senhor dos Anéis. Em uma fazenda das cercanias, de nome Hobbiton, está aberta à visitação a vila cenográfica em que viviam os hobbits no filme de Peter Jackson. Fixamos acampamento em Matamata no Opal Hot Springs and Holiday Park, que tinha uma piscina de água termal deliciosa.

Hobbiton, Nova Zelândia
Entrada da fazenda de Hobbiton, cenário de O Senhor dos Anéis (Greg Balfour Evans/Alamy/Reprodução)

Rotorua, 56 quilômetros adiante, concentra grande parte da comunidade maori do país. Das cerca de 70 mil pessoas que vivem na região, 35% são de descendência indígena. Tivemos a chance de ver uma apresentação de haka, dança maori altamente energética, ou, melhor seria dizer, viril, uma espécie de grito de guerra que servia tanto para atacar tribos inimigas quanto para saudar visitantes. Os jogadores da seleção de rúgbi do país, os All Blacks, dançam a haka antes de cada partida que disputam (busque no YouTube).

Rotorua é famosa pela atividade vulcânica intensa do subsolo, que se traduz em áreas em pleno centro da cidade com piscinas de lama e fontes de água quente (e um forte cheiro de ovo podre, é preciso dizer). Visitamos Te Puia, um complexo que engloba poços de lava borbulhante, gêiseres que espirram água a uma altura de 7 metros e um teatro no qual rolam apresentações de haka. E pudemos ver o feioso kiwi, que possui um bico grande e pontudo. Em Rotorua, pela primeira vez desde nossa partida de Auckland, dividimos o gramado do camping com vários motorhomes.

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Nova Zelândia
Na região de Rotorua, de muita atividade vulcânica, gêiseres podem jorrar água a inverossímeis 7 metros de altura (Latitudestock-TTL/Getty Images)

Continuamos a viagem por mais 80 quilômetros até alcançar o Lago Taupo, o maior do país, com 600 quilômetros quadrados. O azul-celeste da água e as montanhas cobertas de neve são bem fotogênicos, ainda mais com uma plataforma de bungee jump ornando a paisagem. O centro de Taupo não tem nada de mais, a não ser o avião Douglas DC-3 ao lado do McDonald’s. As crianças podem comer nas mesinhas de aço desse antigo avião. As meninas curtiram e trocaram a sopa Naked por nuggets.

Fomos dirigindo pela bonita orla do lago, dando uma parada rápida no centro de informações da cidadezinha de Turangi, para depois desviarmos o caminho rumo às montanhas até a entrada do Tongariro National Park. O lugar abriga três imensos vulcões: Tongariro, Ngauruhoe e Ruapehu. O Monte Ruapehu é o pico mais alto da Ilha Norte, com 2 797 metros, mas foi o Ngauruhoe que alcançou o estrelato ao “desempenhar” o papel de Montanha Doom no filme de Peter Jackson.

Tongariro National Park, Nova Zelândia
Estrada do Tongariro National Park (Stevem Francis/Alamy/Reprodução)

Um dia é pouco para explorar o Tongariro, mas era o tempo que tínhamos. Há muito que fazer por lá, como esquiar a 500 metros da cratera do Monte Ruapehu e encarar uma travessia a pé de 19 quilômetros, o que seria demais para o nosso caso. Preferimos contemplar o Ruapehu de longe pelas janelas do luxuoso hotel Chateau Tongariro, construção inspirada no Chateau Lake Louise, um dos hotéis mais chiques do Canadá, na região de Banff. O deleite maior: havia muita neve, e foi uma alegria para Stella e Sophia, que afundaram suas botas e fizeram um boneco com direito a nariz de cenoura.

Monte Ruapehu, Nova Zelândia
Ovelhas e o Monte Ruapehu em um típico dia de inverno na Ilha Norte (Hideo Kurihara/Alamy/Reprodução)

Regressamos para Turangi, que também beira o Taupo. Sem tempo a perder, fomos direto para as piscinas públicas de águas termais Tokaanu. Naquela noite decidimos fazer wild camping, ou seja, abrir mão do acampamento convencional e parar a campervan onde bem entendêssemos. Resolvemos que seria à beira do Taupo. Acordamos com a visão de cisnes-negros nadando no lago.

Reta final

Daquele ponto em diante tínhamos mais dois dias antes de chegar a Auckland e devolver o veículo. Pegamos a estrada rumo Hamilton, a quarta maior cidade do país. Montamos acampamento em Otorohanga, 105 quilômetros a noroeste de Turangi, num camping que valeu pelos playgrounds, que as meninas adoraram. Fora isso, a cidadezinha não tem muito a dizer. As pessoas só passam por Otorohanga porque as notáveis Cavernas Waitomo ficam lá perto. Doze anos atrás, eu e meu irmão Guto encaramos um rafing por dentro de uma delas. Fazia um frio danado, e a caverna estava com nível de água mais alto do que o normal. Descemos em um rapel e seguimos o louco fluxo da corredeira em boias. Hoje sou menos corajosa: encararia uma das outras cavernas com fácil acesso, como a Ruakuri.

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Caverna de Waitomo, Nova Zelândia
As cavernas de Waitomo são famosas pelas luzes, provenientes de seres bioluminescentes (2il org/Flickr)

De Otorohanga, faltavam 175 quilômetros até Auckland. Erramos o caminho e fomos parar no centro da cidade com aquele carro imenso, mas no fim deu tudo certo. Enquanto eu tirava as roupas dos armários e colocava na mala, dei-me conta de que não estava com a mínima saudade de casa nem da minha cama. Naquele momento, cogitei seriamente levar uma vida cigana.

Prepara!

Mapa Nova Zelândia
(Martini/Viagem e Turismo)

MELHOR ÉPOCA

A Nova Zelândia vive as estações do ano simultaneamente com o Brasil. Nos meses de verão as temperaturas oscilam entre 17 °C e 32 °C na Ilha Norte e, no inverno, entre 6 °C e 17 °C. O melhor do inverno é que há menos turistas e, para quem curte esquiar, o Monte Ruapehu é boa pedida.

DINHEIRO

A moeda do país é o dólar neozelandês.

COMO CHEGAR

Não há voos diretos entre o Brasil e a Nova Zelândia.

COMO CIRCULAR

O aluguel da campervan você pode fazer pela internet (importante lembrar que se dirige na mão-inglesa). A empresa usada nesta reportagem foi a Wilderness. Outras locadoras tradicionais são a Jucy, a Maui e a Wicked Campers. Há mais de 1 100 campings no país com ótima infra (veja uma relação em holidayparks.co.nz). Os campings são pontos de apoio fundamentais para abastecer o motorhome com água e eletricidade e também se desfazer da água utilizada nas pias e no vaso sanitário. Reservar é indicado no período entre o Natal e o Ano-Novo, no final de janeiro e início de fevereiro (feriados nacionais) e também na Páscoa.

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DOCUMENTOS

Brasileiros não precisam de visto para estadas de até três meses, mas pode ser necessário provar ao agente de imigração que você tem condições de se sustentar no período em que estiver no país (cerca de NZD 1 000 por mês, por pessoa, em dinheiro, traveller checks ou limite de cartão de crédito). Para aluguel de veículos, é necessário apresentar a carteira internacional de motorista, que pode ser obtida no Detran do seu estado. Tradução juramentada da carteira do Detran também é válida.

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